No mês de abril, total arrecadado pelas
associações de trabalhadores teve uma queda em torno de 90% sobre mesmo período de
2017. Com recursos escassos, entidades cortam pessoal e sacrificam parte do
patrimônio.
Como já era esperado, o “ajuste fiscal”
chegou também para os sindicatos. Depois da entrada em vigor da reforma
trabalhista, em novembro de 2017, que acabou com o imposto sindical, as
entidades viram sua arrecadação despencar 88% nos quatro primeiros meses do
ano, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Enxutos, os
sindicatos querem contornar o baque se mostrando mais atuantes junto aos
trabalhadores e tentam compensar parte da queda de receita com a conquista de
novos associados.
As mudanças nas leis trabalhistas
drenaram recursos dos sindicatos. Apenas em abril, o volume total arrecadado
pelas associações que representam trabalhadores teve uma queda em torno de 90%
em relação ao mesmo mês de 2017. Isso porque, com a nova
legislação, em vigor há mais de seis meses, a cessão obrigatória do equivalente
a um dia de trabalho, que era destinada aos representantes dos trabalhadores (sindicatos,
centrais, federaçõese confederações) e Governo Federal (Ministério do Trabalho),
foi extinta. A contribuição ainda existe, mas agora é voluntária.
“A extinção da contribuição
fragilizou as entidades”, diz Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico nacional do
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“Os sindicatos agora buscam uma alternativa de financiamento coerente com o
princípio da autonomia dos empregados.”
O desemprego elevado também
colabora para a escassez de recursos. Sem uma vaga formal, o trabalhador não se
filia e nem contribui às entidades. Com menos dinheiro, os sindicatos se viram
obrigados a cortar despesas para sobreviver: demitiram funcionários, fecharam
subsedes, venderam carros, alugaram imóveis e reformularam os serviços
prestados aos associados. A tendência, segundo dirigentes, é que as entidades
se acostumem a operar com menos recursos em caixa.
De volta às origens
Um dos efeitos percebidos após a
reforma trabalhista é a volta dos sindicatos para ações de rua, seja com mais
mobilizações nas portas de fábricas ou no maior esforço direcionado a aumentar
a quantidade de sindicalizados. A maior parte das entidades diz ter reforçado
as equipes de campo, mesmo com um quadro mais enxuto. Funcionários que antes só
exerciam atividades internas foram deslocados.
No Sindicato dos Empregados em
Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros (Sindeepres), como a frota de
veículos próprios teve de ser reduzida pela metade, de 33 para 15, desde o ano
passado, parte dos funcionários agora vai de ônibus promover ações nas
empresas. Um dado positivo é que as
entidades percebem um aumento no número de associados desde o início da reforma.
No Sintracon-SP, que reúne os trabalhadores da construção civil, a quantidade
de filiados passou de 19 mil, em dezembro de 2017, para 69 mil em abril deste
ano, de acordo com o presidente, Antonio de Sousa Ramalho.
“O nosso trabalho de campo
aumentou, deslocamos parte da equipe que antes tinha funções internas para ir
até o canteiro de obras, para ouvir as demandas da categoria. Mas o que a gente
também percebe é que muitos trabalhadores passaram a procurar espontaneamente o
sindicato para se filiar.”
Ele diz que a reforma está
mudando a imagem que o trabalhador faz do sindicato. Com a economia fraca e o
desemprego perto de 13%, aumentou a insegurança, sobretudo em relação às novas
formas de contratação, como o trabalho intermitente.
Sindicato vende até terreno para sobreviver
Com recursos escassos, entidades
cortam pessoal e sacrificam parte do patrimônio. Imóveis para alugar, carros à
venda e cortes de pessoal. A rotina dos sindicatos não tem sido fácil nos
primeiros meses de reforma trabalhista. Desde o fim do ano passado, o texto,
que retirou a obrigatoriedade da contribuição sindical, tem forçado o dirigente
a cortar custos e buscar fontes alternativas de receita para sobreviver.
O Estado ouviu alguns dos
sindicatos laborais que mais receberam recursos em 2016 e 2017, antes da
reforma entrar em vigor. A maioria deles teve de cortar na carne para
equilibrar as contas. A dependência do imposto tem cobrado caro e o sentimento
é de preocupação. No Sindicato dos Securitários de São Paulo, por exemplo, 80%
da receita vem da contribuição, que agora é facultativa.
Os representantes dos químicos de
São Paulo não tiveram outra saída além de fechar as quatro subsedes. Os imóveis,
que são próprios, ficarão sem uso por tempo indeterminado. Eles dizem que ainda
tentam redefinir prioridades na atuação do sindicato e que desde a reforma
intensificaram a presença na porta das fábricas.
Para economizar, o Sindicato dos
Empregados em Empresas de Prestação de Serviços a Terceiros (Sindeepres) teve
de desativar 3 dos 14 andares da sua sede, no centro de São Paulo. Os espaços
serão alugados ou vendidos. Eles também estão vendendo um imóvel que era usado
para atividades de apoio, em Santos, e um terreno na cidade de Ilha
Comprida. “A reforma trabalhista pegou todo mundo de surpresa. No
ano passado, recebemos R$ 6,7 milhões de contribuição. Este ano, esse valor
passou para R$ 1,2 milhão, poucos trabalhadores contribuíram. Ainda assim,
conseguimos chegar a um equilíbrio entre receitas e despesas, mas não é nada
fácil”, diz o presidente, Genival Leite.
Antonio Neto, do Sindicato dos
Empregados em Empresas de Processamento de Dados, diz que a reforma
desconsiderou o modelo sindical brasileiro. “Mas nós estamos otimistas que o
Supremo Tribunal Federal vai reconhecer a necessidade do financiamento.”
O vice-presidente do Sindicato
dos Trabalhadores em telecomunicações (Sintetel-SP), Mauro Britto, reconhece
que é preciso se reinventar. “Fizemos
uma parceria com escolas técnicas, para que os trabalhadores pudessem estudar
por R$ 145. A condição para participar é ser sócio. Conseguimos 1.600 novos
filiados apenas em abril.”
Reajuste
O Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) havia estimado, em novembro, que
cerca de 100 mil empregados diretos e indiretos que atuam em entidades
sindicais seriam afetados pela reforma. No sindicato dos trabalhadores da
construção de São Paulo, os cortes quase extinguiram o setor que prestava
serviço médico aos filiados. “Dos 450 funcionários, ficaram 150. O atendimento
foi mantido porque fizemos uma parceria com uma entidade do setor, mas quase
todos os médicos contratados do sindicato foram demitidos”, diz o presidente do
Sintracon-SP, Antonio de Sousa Ramalho.
“O desafio agora é continuar
oferecendo benefícios sem poder aumentar a despesa. Essa matemática virou
rotina. Infelizmente, a reforma pegou quase todo mundo desprevenido”, diz ele.
O Sintracon-SP também teve de vender uma subsede que ficava em Taboão da Serra,
na Grande São Paulo.
O corte no quadro de pessoal não
afetou apenas os sindicatos. O próprio Dieese, que até o ano passado tinha uma
equipe de 360 pessoas, ficou com 230. E deve operar o ano que vem com a metade
do orçamento de 2015. “O ajuste não foi pequeno e não descartamos mais cortes.
A nossa fonte de financiamento é sindical e de convênios e contratos. Neste
momento, em que a crise fiscal dos Estados cria dificuldades, a interrupção de
uma parceria nos leva a perder um funcionário que tinha sido treinado por
décadas”, diz o diretor técnico Clemente Ganz Lúcio.
Fonte:
Douglas Gravas / Estadão
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